A história do Sisters of Mercy é curiosa. Um dos principais nomes do movimento pós-punk britânico, a banda tem mais de três décadas de carreira, faz turnês mundiais anualmente e, no entanto, nadando completamente contra a maré da maioria dos grupos do planeta, possui apenas três discos em seu currículo - apesar de nunca ter parado de apresentar novas músicas aos fãs. E gravá-las não é um plano para o quarteto, que faz show único em São Paulo neste sábado (8), no Via Fuchal.
"Poderíamos registrar essas canções em disco, mas certamente isso custaria tempo e dinheiro", explicou o vocalista e fundador do quarteto, Andrew Eldritch, 52, em entrevista exclusiva ao Terra. "Há também o fato de que seria bastante difícil encontrar um selo para investir nisso com a atual realidade do mercado fonográfico, já que todas as gravadoras estão mortas. Não há mais nenhuma chance para elas".
O discurso, marcado por um pesado sotaque inglês, não destoa muito daquele feito pela maioria dos artistas nos últimos anos, com a diferença de que Eldrich parece pouco se importar para o problema. Muito antes de a atual crise se impor sobre as companhias da indústria e seus artistas, quando proliferaram os sites de downloads de músicas grátis pela internet, sua banda já havia decidido não entrar mais em um estúdio para produzir material inédito. Vision Thing, o último trabalho do Sisters, foi lançado em 1990.
"Provavelmente, esta realidade têm arruinado os negócios de grande parte dos músicos. Mas não a vejo como um grande problema para nós porque tocamos suficientemente ao vivo, o que nos dá a oportunidade de continuar sendo músicos profissionais", diz. "Além do mais, as companhias foram advertidas de que isso iria acontecer, mas não fizeram nada para mudar. Agora elas só têm a si próprias para culpar, o que deve deixá-las bastante estressadas".
Eldritch, no entanto, não acredita no fim do monopólio na indústria fonográfica. Para ele, a tendência é que este apenas mude de mãos, continuando a enriquecer grupos específicos voltados para o entretenimento. "No momento, tudo dependerá do resultado da batalha entre Apple e Amazon, as principais comercializadoras de música. Há, claro, a possibilidade de ambas continuarem no mercado juntas, se conseguirem oferecer bons serviços a preços decentes. Tenho a convicção de que, se isso for feito, se houver garantia e qualidade nos produtos, as pessoas estarão dispostas a pagar por eles".
Discrição
Há muitas coisas que Eldritch assume não lhe agradarem. Contudo, de injustiças sociais ao Partido Republicano norte-americano, das gravadoras ao título de padrinho dos góticos, nada parece deixá-lo mais desconfortável do que falar com jornalistas - a ponto de ter ficado 12 anos sem fazê-lo, entre 1997 e 2009. "Eu não tenho realmente nada a dizer em uma entrevista", se justifica o músico.
"Não gosto de falar sobre minha vida pessoal, até porque eu já digo muitas coisas nas canções do Sisters. Não que elas sejam autobiográficas, mas fornecem a possibilidade de compreender o motivo que me levou a escrever aquilo. E isso realmente é suficiente para mim", explica, procurando salientar à reportagem que a crítica não é "pessoal".
O título de padrinho dos góticos também não é algo que agrada ao cantor, tendo se tornado outro grande motivo para evitar a imprensa. "É só quando eu falo com pessoas como você (jornalistas) que esse tipo de assunto surge", lamenta. "No resto do tempo, isso realmente não é algo em que pensamos, e o público definitivamente não liga para isso. Quando você ouve o Sisters, geralmente sabe que está ouvindo o Sisters. E isso é o suficiente para mim".
Misterioso, Eldritch deixa poucas coisas claras, falando sobre elas da forma mais superficial possível. Por exemplo, sobre o repertório do show em território paulistano, ele afirma haver a possibilidade de executar algumas canções ainda desconhecidas dos brasileiros, apesar de não confirmar isso pelo fato de elaborar os set lists apenas nas tardes anteriores de seus shows. Sobre o que gosta de fazer quando excursiona no exterior, confessa adorar caminhar pelas ruas da cidade onde está, lamentando de forma mal humorada que isso não seria possível nesta passagem por São Paulo devido às entrevistas agendadas.
Nos hoteis em que fica hospedado, o músico sempre se registra com um codinome. E mesmo o país onde vive é capaz de se tornar alvo de controvérsia para ele: "vivo na Europa e é isso. Se te disser mais, terei que matá-lo", encerra aos risos.
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