Axl Rose: ‘ Vocês São Todos Desprezíveis’ – Parte VI

De acordo com um agitador cultural de Los Angeles daquela época conhecido como Vaginal Creme Davis, foi por volta desse momento que Axl começou a usar ‘aqueles disfarces tipo os do Michael Jackson – bigodes falsos e jaquetas de nylon; ’ Apesar de raramente ser visto à luz do dia, ele pedia a Beta ou o filho dela, Fernando, que o levassem de carro até a praia, ou mais frequentemente, ao cinema. Mesmo quando ele era visto ocasionalmente em shows – nos bastidores com Dave Navarro num show do Red Hot Chili Peppers, aparecendo do nada para ver Radiohead – a aparência de Axl tinha mudado tão drasticamente [ele estava mais robusto do que no auge, e tendia a vestir-se em jeans e camisas xadrez] que uma testemunha afirma ter visto a segurança revistá-lo porque não o havia reconhecido. De acordo com Moby, “Se você estivesse andando na rua e Axl passasse por você, você nunca notaria. Ele parece um cara normal, decente.”

Quando não estava obcecado com montar a nova banda a seu ritmo no estúdio, ou arrancando seus cabelos para escrever letras, Axl passava a maior parte de seu tempo por trás de seus portões automáticos em sua reservada casa em Latigo Canyon. Com Beta fazendo todas suas compras e dirigindo pra ele, Axl passava quase todos seus dias ou malhando – ultimamente, ele tinha desenvolvido um apreço pelo kickboxe – ou fuçando em uma impressionante coleção de computadores de última geração que ele também tinha montado, ou simplesmente jogando fliperama. Ele também começou a ter aulas de guitarra pela primeira vez. Na verdade, ele se envolveu tanto com o trabalho que ele estava fazendo som o seu professor, o ex-membro do Circus of Power, Gary Sunshine, que ele o convidou para participar de algumas das sessões no estúdio.

Uma vez por ano ele convidava amigos e suas famílias para uma festa a fantasia especial de Halloween. Decorando a piscina com Zé – lanternas e teias de aranha falsas penduradas nas palmeiras, ele também construía labirintos especiais. Os convidados nessas festas depois descreveriam-no como estando quase tão animado quanto todas as crianças presentes, enquanto ele transitava, se divertindo. Dave Quakenbush, vocalista da banda punk de LA The Vandals, e um convidado da festa de Halloween de 1999, lembra-se de Axl “vestindo uma fantasia de dinossauro. Quando alguns garotos chegaram perto dele e perguntaram se ele era Barney, o Dinossauro, ele disse, ‘Nah! Barney é uma bichona! E daí pensou e disse, ‘Oh, huh, quero dizer, o Barney é um frouxo’”.

À medida que os anos passaram e os filhos de seus amigos crescerem, as festas de Halloween ficaram menores, simbolizando, como um convidado diria depois, o ‘universo encolhedor de Axl’.  Todos os empregados ainda eram obrigados a assinar acordos de confidencialidade contendo severas penas legais e financeiras se quebrados.  Também se tornou costumeiro que todos os empregados entregassem uma foto de si próprios, as quais Axl levaria a Yoda para ‘inspeção psíquica’, para revelar seus verdadeiros intentos; forças e fraquezas. Que tipo de energia eles emitiam. Até fotografias dos filhos dos empregados foram exigidas em uma ocasião.

Até mesmo velhos amigos começaram a sentir os dedos gelados da paranóia de Axl apertando-se claustrofobicamente ao redor deles. “Eu tinha me mudado de volta pra Los Angeles e estava dando um rolê um dia e pensei, porra, vou lá na casa dele,” Izzy lembra. “Filho da puta, ele mora lá em cima do morro, ele tem uma baita duma casa, eu vou lá ver o que ele está fazendo, manja? E eu vou lá e ele tem portões de segurança, câmeras, muros, e toda essa merda, você sabe. Então eu estou tocando no interfone e lá pelas tantas alguém vem e me deixa entrar e lá está ele. E ele manda, ‘Hey, cara! Que legal te ver! Me dá um forte abraço e me mostra a casa. Foi ótimo. ‘Daí, eu não sei, acho que um mês depois, uma noite ele me liga e a gente conversa sobre eu ter saído do Guns N’ Roses. Eu disse a ele como era pra mim. Eu disse exatamente como eu me sentia em relação a isso e o porquê eu saí.” De repente, a conversa virou monólogo. “Digo, ele tinha uma porra dum bloquinho. Eu conseguia ouvir ele virando as páginas e dizendo, ‘Bem, ah, você disse em 1982… blá blá blá… ’ e eu penso, que caralho – 1982? Ele estava revirando umas coisas muito velhas. E eu disse, que seja, mano.”

Foi a última conversa que Izzy teria com Axl por quase uma década. “A cada dois ou três anos eu ligo pro escritório e digo, ‘Hey, digam a Axl pra me ligar se ele quiser’. Mas eu acho… a estranheza da vida dele. Pra mim, eu vivo uma vida bem normal. Eu posso ir a qualquer canto. Eu não acho que as pessoas se importem. Mas pro Axl, eu o conheço faz muito tempo, porque o rosto dele estava na televisão e tals, eu não acho que ele poderia ir a qualquer lugar ou fazer qualquer coisa. E eu acho que por causa disso ele se enfiou num buraco lá nas montanhas. Ele meio que se recolheu cada vez mais e mais e eu acho que ele está tão afundando nele agora que… digo, eu poderia estar completamente errado. Mas eu sei que ele não dirige e não… ele não faz nada. Eu nunca, nunca o vi na região central da cidade. O isolamento pode ser algo ruim, mas Axl tem estado nele já faz tento tempo. Sabe, ele sempre fica acordado à noite…” Izzy comentou, balançando a cabeça, sem saber mais o que dizer.



Ocasionalmente, um raio de luz quebrava as trevas. Em abril de 1997, o superastro do basquete Shaquille O’Neal se viu gravando num estúdio adjacente e decidiu espiar pela porta e ver o que Axl e os caras estavam fazendo – e acabou fazendo um rap com eles. “Eles me chamaram pra juntar-me a eles,” lembra Shaq, “então eu mandei um free style em cima da faixa deles. Foi a primeira vez que eu toquei com um grupo de rock, foi bom.”

No dia 6 de Fevereiro de 1998, Doug Goldstein organizou uma ‘festa surpresa’ para Axl, para celebrar seu trigésimo – sexto aniversário. Realizada num restaurante Mexicano em Santa Monica, Goldstein tinha, claro, pedido permissão a Axl para fazer o evento. Tendo recebido sua benção, Goldstein montou uma festa de porte considerável para a ocasião, incluindo vários amigos, velhos e novos, a maioria músicos do mesmo circuito de West Hollywood que Axl tinha crescido, misturado com pessoas mais velhas e importantes da indústria musical, de ternos, comendo guacamole e bebendo de jarras de margaritas feitas com Cuervo. Todo mundo do grupo de 40 pessoas tinha levado presentes, e um enorme bolo de aniversário estava num canto do restaurante. Quando o relógio bateu meia-noite e Axl ainda não havia aparecido, entretanto, algumas pessoas começaram a ir embora. Goldstein fez uma ligação tensa para Axl em seu celular. Más notícias: Axl não compareceria no final das contas. Sobrou pra Doug, como sempre, limpar a bagunça. “Axl não vai vir,” ele disse ao grupo. “Mas podem pedir qualquer coisa e se divertirem.”

Ironicamente, a primeira aparição pública de Axl em alguns anos ocorreu menos de uma semana depois, quando ele foi preso no Aeroporto Internacional Sky Harbor em Phoenix depois de entrar em uma briga com a segurança. “Eu vou mandar vocês pro chão aqui e agora!” ele gritou para um guarda enquanto ele fazia uma revista de rotina na bagagem dele. “Eu tô pouco me fudendo pra quem você seja. Vocês são todos gentinha desprezível que se acham grande coisa!” Ameaçado com prisão, Axl continuou seu chilique: “Tô pouco me fudendo! Me coloquem na cadeia!”

Vestindo jeans, um moletom vermelho e um boné de pano cinza, Axl foi levado para passar algumas horas por detrás das grades em uma delegacia local. Um ano depois, ele se declarou ‘culpado’ do delito de perturbação de ordem pública e foi multado em US$500 e um dia na cadeia – que considerou-se que ele já havia cumprido.

Por que ele ficou tão irritado com que revistassem sua bagagem? Amigos agora dizem que foi porque ele estava portando certos presentes que ele tinha recebido recentemente e que estava levando para uma ‘inspeção’ de Yoda, cujo bastião New Age ficava a 115 milhas ao norte de Phoenix [os presente incluíam uma grande esfera de vidro soprado que Axl ficou preocupado que pudesse quebrar].

Enquanto isso, naquelas cada vez mais raras ocasiões quando ele de fato dava as caras, ele sempre era perguntado as mesmas perguntas chatas: o que tinha acontecido com Slash e Duff e os caras? E quando sairia o disco novo?

Quando Todd Sullivan, então trabalhando como ‘executivo de talentos’ para a Geffen, levou uma pilha de CDs com vários produtores para Axl, com uma nota sugerindo que ele poderia gostar que algum deles trabalhasse no novo disco, a resposta de Axl foi colocar os CDs na rampa da garagem e passar por cima deles com sua Ferrari prateada. Algum tempo depois, o mesmo executivo persuadiu Axl a tocar alguns pedaços das coisas nas quais ele estava trabalhando. Depois disso, ele disse a ele: “Olha, Axl tem umas coisas ótimas, muito promissoras aqui. Por que você não pensa em enfiar a cara e acabar algumas dessas canções?” Ao que Axl respondeu: “Hm, enfiar a cara e terminar algumas dessas canções?” No dia seguinte, Sullivan recebeu uma ligação do presidente da Geffen, Eddie Rosenblatt informando a ele que ele estava ‘fora do projeto’.

Com os custos agora disparando, entretanto, figures mais significantes da indústria se perguntavam porque os executivos da Geffen toleravam tal comportamento. A verdade é que a Geffen estava enfrentando uma onda de dificuldades a respeito de seu próprio futuro. David Geffen tinha vendido o selo para seu equivalente corporativo, a MCA Inc., em 1989. Em 1988, a MCA já tinha sido engolida pela gigante das bebidas alcoólicas Seagram, cujo dono, Edgar Bronfman, achava impossível dar alguma razão pela qual a entrega de um novo disco do Guns N’ Roses estava sendo tão difícil. Decidindo sanear o problema com dinheiro, ele autorizou um ‘incentivo’ adicional de US$ 1 milhão para Axl, com a promessa de mais US$ 1 milhão caso ele entregasse o disco terminado em março do ano seguinte.

Com Sean Beavan na mesa de produtor em Abril de 1998, contudo, o trabalho pareceu finalmente ganhar ritmo e ao curso dos nove meses seguintes a banda gravou a melhor parte das 30 canções, retrabalhando-as continuamente até que Axl escrevesse a letra, incluindo temas como ‘Prostitute’, ‘Cock-a-roach Soup’, ‘This I Love’, ‘Suckerpunched’, ‘No Love Remains’, ‘Friend or Foe’, ‘Zip It’, ‘Something Always’, ‘Heart Gets Killed’, e ‘Closing In On You’. Um título pro disco também foi divulgado publicamente pela primeira vez: 2000 intentions, sugerindo que seria lançado a tempo de comemorar a virada do milênio. Quando, contudo, tornou-se óbvio que isso não seria mais possível, o título foi mudado para o deliberadamente anômalo ‘Chinese Democracy’.

Dois meses antes da nova data de entrega, em Janeiro de 1999, a Seagram passou por uma reestruturação completa de sua divisão de música, deixando 110 funcionários da Geffen na rua, incluindo o apoiador de longa data de Axl, Rosenblatt. Dali em diante, os problemas da Geffen seriam observados pela divisão muito maior da corporação, a Interscope Records; o disco não-acabado do GN’R agora estava tornando-se responsabilidade do chefe da Interscope, Jimmy Lovine, um ex-produtor renomado por ser ‘afável com os artistas’.

Jimmy Lovine, Fergie e Dr. Dre

Axl, entretanto, ficou bolado com esse mais recente desenrolar. Com ninguém mais da antiga equipe da Geffen que tinha o contratado em 1986, ele começou a se sentir progressivamente mais isolado. Inevitavelmente, o prazo de março veio e foi sem ele nem se tocar. Na verdade, quando, no dia 16 de Março, a banda foi um dos primeiros artistas a serem presenteados com o novo prêmio de ‘Disco de Diamante’ da RIAA, comemorando as vendas de mais de 10 milhões de cópias de ‘Appetite For Destruction’ nos EUA, Axl – o único membro sobrevivente da formação que tinha gravado o disco – recusou-se a comparecer à cerimônia em Nova Iorque. Nem Slash ou Duff, nem mesmo Izzy, concordaram em ir. No fim, foi a figura solitária de Steven Adler quem apareceu para receber o prêmio e dizer algumas palavras de agradecimento.

 [continua]